Enquanto a França proíbe uso da burca, Constituição brasileira garante os direitos religiosos
Nesta semana, entrou em vigor a lei aprovada pelo parlamento francês que proíbe o uso do véu islâmico em espaços públicos. A nova regra prevê multas de 150 euros para mulheres que desrespeitarem a proibição e punição de 30 mil euros e um ano de prisão para homens que forçarem suas mulheres a usarem burcas. A questão da liberdade – e da tolerância – religiosa, embora de caráter pessoal, tem consequências também no ambiente corporativo.
No Brasil, segundo Cristiano Rosa, headhunter e professor de gestão em recursos humanos da Veris Faculdades, o mercado é mais tolerante com a diversidade de religiões e foca-se mais em encontrar profissionais que tragam resultados concretos para as companhias. “Ainda existem empresas que não aprovam candidatos porque na entrevista eles falam que são de determinadas religiões”, relata Rosa. ”Mas, em sua maioria, as companhias cada vez mais repudiam atos como esse e incentivam a diferença”.
Segundo Rossana Ercole, headhunter da Global Network, é comum encontrar companhias que se adaptaram aos horários de trabalho de adventistas e judeus ortodoxos (ambos não trabalham aos sábados). “Essas pessoas acabam se tornando muito fiéis à empresa quando são tratadas com respeito e sem discriminação”.
Do outro lado, os funcionários também devem respeitar a religião dos colegas de trabalho. Rossana ressalta alguns cuidados:
- Símbolos ou frases religiosas no trabalho: podem ser aceitos, desde que as outras pessoas não sejam distraídas por eles ou não considerem ofensivos. O escritório é um lugar para realizar negócios. É preciso cuidado para não passar a impressão de que está impondo suas opiniões e crenças.
- Pregação no trabalho: pressionar as pessoas para que mudem de religião ou colocar textos religiosos em quadro de avisos são atitudes que podem gerar polêmicas e devem ser evitadas.
- Modo de se vestir: a profissional que usa véu, saias mais longas ou qualquer outra vestimenta por motivação religiosa deve ficar atenta à reação dos demais funcionários. Se alguém considerar a atitude como um excesso religioso, o melhor é discutir a questão com o gestor e tentar se chegar a um acordo.
- Transparência: ao ser contratado por uma empresa, é interessante sempre que haja uma conversa franca com o chefe. Informe em relação aos horários de trabalho e dias considerados feriados na sua religião e tente uma fórmula que não prejudique a empresa e permita o cumprimento das atividades religiosas.
Leis
Leandro Tromps, advogado trabalhista do escritório Tromps, Santos & Nascimento Advogados Trabalhistas, afirma que a Constituição brasileira prega a igualdade e a tolerância, mas não existe uma norma trabalhista específica que regule esse cenário. “O artigo 5º fala sobre os direitos e garantias fundamentais de toda e qualquer pessoa. Com base nesses princípios, podemos aplicá-los na relação de discriminação religiosa no trabalho”, analisa Tromps. Além disso, a Constituição define como crime praticar, induzir ou incitar a discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional.
Segundo Ana Lucia Paiva, advogada trabalhista do Lobo & Rizzo Advogados, a pessoa que se sentir nessa situação pode entrar com uma ação na Justiça e pedir que o juiz obrigue a empresa, por meio de uma sentença, a mudar sua forma de agir, ou a deixar de praticar determinada conduta. O profissional pode, ainda, pedir indenização por danos morais. “Além disso, em casos extremos, o funcionário pode pedir a rescisão indireta do contrato”.
Uma ótica de Cuiabá, por exemplo, foi condenada a pagar R$ 5 mil de indenização por dano moral decorrente de discriminação envolvendo a crença religiosa de uma trabalhadora que não chegou a ser contratada. A funcionária havia sido chamada para trabalhar como gerente de loja.
Segundo alegou no processo, quando a diretora da empresa ficou sabendo que havia tido um filho fora do casamento, a empresa voltou atrás na decisão de contratá-la. Ambas, diretora e funcionária, eram testemunhas de Jeová. Em sua defesa, a empresa afirmou que a demissão foi feita apenas porque algumas religiões não permitem trabalho aos sábados. E que deixaram de contratar a trabalhadora porque ela não demonstrara ter a qualificação necessária para o cargo.
Por outro lado, em casos extremos – por exemplo, quando a pessoa prega sua religião durante o horário de trabalho – o profissional pode sofrer uma sanção trabalhista, como uma advertência da empresa. “O funcionário religioso não pode ser discriminado, mas também não pode abusar com o radicalismo”, diz Ana Lúcia.
Trajes
Tromps destaca que o modo de o profissional se vestir deve ser uma decisão individual. Segundo ele, não é proibido que uma muçulmana use a burca, por exemplo, ou que uma adepta de determinadas religiões evangélicas use saias e blusas de um modelo específico. “A organização não pode falar para ela se vestir como a maioria. Isso é discriminação.”
Em relação aos feriados religiosos, Ana Lucia Paiva afirma que a empresa é obrigada a permitir que os funcionários não trabalhem nesses dias. “Se proibirem, pode haver uma interpretação de que a companhia está discriminando a pessoa por sua religião”.
Fonte:http://www.jneweb.com.br/
Postado em 17 de abril de 2011
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