Engenheiro espera converter o mercado a adotar o que considera a Bíblia digital definitiva
O brasileiro Nelson Saba trabalhava em Nova York com amplas perspectivas de carreira no setor de tecnologia da informação, quando vislumbrou o que realmente queria fazer de sua vida. A inspiração se transformou num plano bem claro ao longo dos nove anos seguintes. Seu novo propósito exigiria que ele deixasse o emprego seguro e bem remunerado. Saba fez a transição de forma lenta, o que não significa que sua inspiração fosse menos poderosa ou ambiciosa. Ele tentaria fazer a melhor Bíblia digital do mundo. “Era o meu destino. Era o que eu estava aqui para fazer. Quando você tem uma visão assim, isso te consome”, diz o engenheiro, hoje com 52 anos, sócio e executivo-chefe da Immersion Digital, responsável pela Bíblia digital Glow.
Saba, um evangélico, manifesta sua religiosidade com a discrição e a abordagem metódica que convém a um engenheiro formado pelo Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA), que forma profissionais disputadíssimos pelas grandes empresas. Assim que pegou o diploma, começou a trabalhar no banco americano Citibank. Em 1985, foi transferido para Orlando, e de lá para Nova York. Começou a escalar os cargos a sua frente – ao mesmo tempo que pensava nos detalhes do futuro empreendimento. Em 1994, percebeu que chegara o momento de escolher um dos caminhos possíveis. Pelo mais seguro, abraçaria as responsabilidades de vice-presidente de tecnologia do banco. Pelo mais árduo, tentaria converter as massas à leitura da Bíblia digital.
Nos dois anos seguintes, trabalhou como consultor financeiro autônomo, enquanto organizava sua primeira empresa. Investiu US$ 48 mil na compra de equipamento e software e reuniu amigos programadores em torno da missão de desenvolver uma Bíblia multimídia. Naquela ocasião, não havia produto parecido no mercado, o que atrapalhava o relacionamento com potenciais parceiros e investidores. “Ninguém confiava num produto que não conhecia. No começo, era muito mais provável dar errado do que dar certo”, diz. O resultado foi a iLumina, uma Bíblia digital que vende
O bom resultado empolgou Saba. Enquanto estudava como melhorar a iLumina, ganhou uma espécie de curso doméstico sobre o comportamento das novas gerações: observava a evolução dos hábitos de leitura das filhas mais velhas, hoje com 25 e 17 anos (ele teria mais duas, hoje com 6 e 4). Em 2006, teve o impulso definitivo para tentar um novo lançamento. Numa reunião na casa de um amigo na Califórnia, conheceu um taiwanês chamado Tim Chen, a quem explicou seu projeto. Por e-mail, Tim trouxe para a conversa seu irmão, Phil Chen – também evangélico, formado em física, matemática pura e teologia e sobrinho do fundador do gigante de eletrônicos HTC, que faturou US$ 9,6 bilhões no ano passado (desde 2009, Phil é também diretor da companhia). Saba e Phil se conheceram na Califórnia e criaram uma nova empresa, a Immersion Digital, sem nenhuma conexão com a HTC. Phil liderou o levantamento de US$ 8 milhões com a família e outros investidores para a criação da Glow, ou Glo, como é chamada nos Estados Unidos.
O resultado foi uma Bíblia digital e interativa elogiada até por concorrentes, com jeito de enciclopédia, milhares de verbetes, mais de três horas de vídeos de alta definição, 500 imagens em 360 graus de locais sagrados e cerca de 2.400 fotos (incluindo obras de arte com temas religiosos e imagens de satélite dos locais mencionados), compactada em três CDs. O usuário pode fazer marcações e comentários e pedir ao software planos de leitura de partes específicas da Bíblia ao longo de períodos determinados. Apesar de pesada (18 Gb) e cara (US$ 90), foi aprovada pelo público americano. Desde o lançamento nos Estados Unidos, em setembro de 2009, houve 65 mil instalações do software e há uma média diária de 1.000 downloads (formato ainda não disponível no Brasil). O lançamento no Brasil, em agosto de 2010, teve resultado mais modesto, mas significativo – 8 mil unidades vendidas até o momento. Apenas para comparação, cerca de 35 mil exemplares da enciclopédia digital Barsa são vendidos em média no mesmo período. Mesmo assim, Saba mantém sob controle as expectativas com relação ao Brasil.
Por meio de um amigo, o brasileiro conheceu seu sócio – um taiwanês cristão de uma família bilionária
Ainda é cedo para afirmar o que ele e Chen conseguirão no mercado brasileiro, embora haja alguns sinais promissores. Segundo a empresa de pesquisas Ipsos, os evangélicos, um grupo assíduo na compra de Bíblias, mostram vontade de consumir tecnologia e informação. Entre eles, a intenção de compra de eletroeletrônicos e de acesso à TV por assinatura é superior à média dos brasileiros. Também é perceptível uma tendência de crescimento da fatia mais jovem, de pessoas entre 13 e 29 anos, nos grupos que se definem como evangélicos ou católicos.
É o caso do estudante Eliel David da Silva, de 16 anos, que vive no Recife. Toda tarde, depois da escola, ele pega o notebook, deita-se na cama e começa a clicar. Entre trocas de mensagens com amigos e espiadelas na rede social Orkut, o garoto faz passeios virtuais pela Glow e diz ler os textos. “Assim eu vou vendo mapas e fotos e escolho fácil que passagem eu quero ler.” Eliel instalou o software na metade de março. Talvez enjoe logo da novidade. Mas há uma chance de que ele se torne um leitor regular e mostre aos amigos evangélicos da mesma idade aquela Bíblia movimentada. Saba e Chen não rezam por isso. Só torcem e trabalham muito para que aconteça.
Fonte:http://www.jneweb.com.br/
Postado em 24 de abril de 2011
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