terça-feira, 28 de dezembro de 2010

Nascesse Jesus mil vezes, mil vezes o mataríamos!


Qual o verdadeiro sentido do natal? O que significa de fato o nascimento de Jesus? A essas perguntas muitas, ternas, sublimes, bobinhas e infundadas respostas foram dadas.

A quem diga, por exemplo, que o natal é época de amor, paz e outros estados de espírito que não passam de meros artifícios retóricos e monótonos romanticamente construídos para fins religiosos igualmente românticos.

Mas absurdo ainda é dizer que o natal representa o nascimento do salvador. Pelo contrário, o natal deveria nos perturbar, pois o filho de Deus trouxe consigo a espada, veio para executar, condenar, questionar, contradizer um conjunto de coisas a muito estabelecidas.

Jesus nasceu, não sem motivo, numa manjedoura, numa estribaria desconfortável, fedorenta e insalubre. Caso viesse hoje, haveria nascido numa favela violenta, à margem da sociedade, em um barraco com chão de terra batida.

A caminha confortável de palha retratada nos presépios não passa de uma fantasia que tem como objetivo exaltar a pobreza limpinha e franciscana a qual o proletariado deve se submeter no inferno do mundo capitalista. Não me entendam mal, eu não sou marxista; é que fui possuído pelo espírito do natal!

Estranho isso: em Roma, um homem, Otávio, imperador romano, deseja ser Deus (augusto). Em Belém, Deus torna-se homem e habita entre nós; Jesus o Emanuel (Deus conosco).

O nascimento de Jesus, acreditem, tem um aspecto jurídico, é uma denúncia contra o nosso materialismo insano e desenfreado que nos transforma, em alguns casos, em idiotas ricos, mas ainda assim idiotas. A manjedoura não é um lugar, é um veredicto!

Depois desse nascimento impróprio para um messias, Jesus foi crescendo e tornou-se contracultura (é isso mesmo, ficou meio hippie). O desenvolvimento rápido do carpinteiro filho de José tornou as suas antigas roupas coronhas!

Daí em diante ele rompeu com a religião, começou a achar graça das atitudes caricaturais dos sacerdotes “espirituais” dos seus dias e ficou mais a vontade com prostitutas, publicanos e pecadores. Teria o mestre apostatado?

O centro religioso de sua época tratou de matá-lo é claro. Mas não sem que antes o nazareno pronunciasse em alto e bom som que “os últimos seriam os primeiros”. O mundo a partir de então virou de ponta cabeça.

Eis aí o verdadeiro sentido do natal: a inversão do status quo, a quebra da lógica ideológica, religiosa e dominante do mundo no qual nasceu. Nascesse Jesus mil vezes, mil vezes o mataríamos!

André Pessoa é teólogo e formado em história. É também professor de sociologia e filosofia.



Fonte:http://www.genizahvirtual.com/
Postado em 28 de dezembro de 2010

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